Filho amado,
Dia de finados. Por que escrever uma carta? Você não findou. Não para mim.
Dia dos mortos? Se o esquecimento é a morte derradeira, você não morreu. Não para mim e enquanto eu viver.
Talvez para eu organizar as ideias . Ou para amenizar as saudades que são infinitas e que apertam mais o coração nessas datas. Pois se “saudade é o amor que fica”, então todo dia é dia de saudade e de amor.
Como diria Santo Agostinho “você partiu para o outro lado do caminho”, mas está presente em cada lembrança, nas nuvens ( será que você está brincando em cima delas), no sol nascente e poente, na chuva que cai ( como gostava do banhos de chuva no calor), nos lugares que costumávamos ir, nas fotografias, nas tantas músicas que ouvíamos e cantávamos juntos.
Outro dia fui num concerto de violino. Lugar improvável de ouvir Aquarela. Não pude evitar as lágrimas de caírem. Aquarela que cantávamos juntos desde que eram bem pequenos e que você me pedia diversas vezes para tocar no carro. Aquarela que cantamos juntos pela última vez no hospital. Aquarela que diz que o futuro é uma astronave que tentamos pilotar e que depois convida a rir ou chorar.
Que ironia a letra de Aquarela tantas vezes por nós cantada. Que ironia você querer ser médico de dor de cabeça. É às vezes parece irônico, você tão novo, descansando cercado de pessoas que partiram com idade bem mais avançadas ( talvez avôs, bisavôs).
Como postou o padre no dia do seu velório “enterrar uma criança de doze anos atenta contra toda lógica. É a penumbra do Mistério de Deus”.
A mim, ainda que não compreenda este Mistério, cabe apenas aceitar. Levando esta saudade e este amor que vai além do que aqui vivemos. Seguindo em frente com a certeza que “o outro lado do caminho” está logo ali e um dia nos reencontraremos.
Com muitas saudades,
Sua mãe.
( escrito em 2 de novembro de 2018, dia de finados)
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