Nenhum morto morre sozinho. Com ele, morrem no mínimo dez ou mais pessoas de modo direto e, indiretamente, uma multidão”. Do sociólogo Roberto Damatta, sobre a tragédia brasileira.
Ou seja, quantos milhões de enlutados temos no Brasil no momento?
Semana passada a Carol perdeu o avô. Meus sobrinhos do coração perderam um dos 4 avôs por eles adotados. A Marisa perdeu a irmã. Só na semana passada.
Durante esse tempo a Silvia, a Cláudia e o Raildo perderam a mãe. A Ana Claudia, a Bibi, a Lucy, a Simone, a Elisa e o Marcelo perderam o pai. A Edna perdeu o irmão e a sobrinha. A Carla perdeu o companheiro de uma vida. O Carlos perdeu os irmãos. Isso pensando rapidamente. Todo dia tem postagens em redes sociais pedindo orações. Ou falando de luto.
Despedidas complicadas, nessa época de pandemia. Seja por Covid ou não. Sem poder abraçar os que ficaram.
No velório do João Pedro, lembro de alguém ter perguntado um pouco antes do sepultamento, se queria que pedisse para as pessoas saírem para poder nos despedir. Respondi que não era necessário, pois já havia me despedido dele no hospital. Sim, tive tempo para me despedir dele. De segurar suas mãozinhas. De entregar meu filho a Deus para que fosse feito o melhor para ele ( creio que foi o ato mais difícil em toda minha vida) e pudesse partir em paz. Ainda assim, tive esse tempo.
Os familiares, amigos deles, amigos nossos puderam se despedir. Muitas pessoas vieram se despedir e prestar a solidariedade. Reconhecer a nossa dor através do olhar ou do abraço e experienciar/ vivenciar parte dela.
Por ser tão surreal, para nós como pais, a morte de um filho ainda mais com tão pouca idade, esse processo de despedida ajuda na percepção da concretude da morte.
Na missa de sétimo dia, várias pessoas ficaram para fora da Igreja. E caiu uma chuva no dia. Ainda assim, parei de receber os cumprimentos mais de uma hora depois.
Não deixaram de ser várias despedidas.
Despedida das suas roupas e pertences ao arrumar o seu armário. Despedida em cada vez que visito você no cemitério. Despedida em cada aniversário sem você por aqui. Despedida em cada data comemorativa em que sua ausência se torna mais presente: Natal, ano novo, Páscoa, dia das mães, dia dos pais, nossos aniversários. Despedida em muitas vezes que rezo.
Nesta semana, li um texto de Teresa Gouvea que tão bem expressa esse sentimento: “ não nos despedimos uma única vez, porque a saudade não tem lugar fixo, ela anda pelos lugares que andamos e, a cada lugar inaugurado sem aquele amor, ocorre uma nova despedida”.
Além da vida ser a “ arte do encontro, embora haja tantos desencontros pela vida” , penso que também é o da despedida, embora haja tantas saudades pela vida.
Ps: ontem a Mariah perdeu o avô e na quinta perdi minha tia