domingo, 11 de julho de 2021

Sobre despedidas


           Nenhum morto morre sozinho. Com ele, morrem no mínimo dez ou mais pessoas de modo direto e, indiretamente, uma multidão”. Do sociólogo Roberto Damatta, sobre a tragédia brasileira. 

           Ou seja, quantos milhões de enlutados temos no Brasil no momento?

            Semana passada a Carol perdeu o avô. Meus sobrinhos do coração perderam um dos 4 avôs por eles adotados. A Marisa perdeu a irmã. Só na semana passada.

            Durante esse tempo a Silvia, a Cláudia e o Raildo perderam a mãe. A Ana Claudia, a Bibi, a Lucy, a Simone, a Elisa e o Marcelo perderam o pai. A Edna perdeu o irmão e a sobrinha. A Carla perdeu o companheiro de uma vida. O Carlos perdeu os irmãos. Isso pensando rapidamente. Todo dia tem postagens em redes sociais pedindo orações. Ou falando de luto.

           Despedidas complicadas, nessa época de pandemia. Seja por Covid ou não. Sem poder abraçar os que ficaram. 

           No velório do João Pedro, lembro de alguém ter perguntado um pouco antes do sepultamento,  se queria que pedisse para as pessoas saírem para poder nos despedir. Respondi que não era necessário, pois já havia me despedido dele no hospital. Sim, tive tempo para me despedir dele. De segurar suas mãozinhas. De entregar meu filho a Deus para que fosse feito o melhor para ele ( creio que foi o ato mais difícil em toda minha vida) e pudesse partir em paz. Ainda assim, tive esse tempo.

            Os familiares, amigos deles, amigos nossos puderam se despedir. Muitas pessoas vieram se despedir e prestar a solidariedade. Reconhecer a nossa dor através do olhar ou do abraço e experienciar/ vivenciar parte dela.

           Por ser tão surreal, para nós como pais, a morte de um filho ainda mais com tão pouca idade, esse processo de despedida ajuda na percepção da concretude da morte.

         Na missa de sétimo dia, várias pessoas ficaram para fora da Igreja. E caiu uma chuva no dia. Ainda assim, parei de receber os cumprimentos mais de uma hora depois.

        Não deixaram de ser várias despedidas.

        Despedida das suas roupas e pertences ao arrumar o seu armário. Despedida em cada vez que visito você no cemitério. Despedida em cada aniversário sem você por aqui. Despedida em cada data comemorativa em que sua ausência se torna mais presente: Natal, ano novo, Páscoa, dia das  mães, dia dos pais, nossos aniversários. Despedida em muitas vezes que rezo.

           Nesta semana, li um texto de Teresa Gouvea que tão bem expressa  esse sentimento:  “ não nos despedimos uma única vez, porque a saudade não tem lugar fixo, ela anda pelos lugares que andamos e, a cada lugar inaugurado sem aquele amor, ocorre uma nova despedida”. 

           Além da vida ser a “ arte do encontro, embora haja tantos desencontros pela vida” , penso que também é o da despedida, embora haja tantas saudades pela vida.




Ps: ontem a Mariah perdeu o avô e na quinta perdi minha tia

18 comentários:

  1. Muitas perdas...nesse tempo de pandemia, sem despedidas, que triste 😌

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  2. Qta verdade diz Roberto Samatra. Minha cunhada, morreu um pouco para a vida. Chora todos os dias e não quer mais saber de nenhuma festividade. Minha sobrinha, continua na terapia duas vezes por semana. Isso tudo é muito triste...

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  3. Sem despedidas é muito triste esse tempo de pandemia 😢😢 palavras muito bonitas e reconfortantes

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    1. O luto já não é fácil. Em tempos difíceis então …

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  4. Denise querida, diante de tamanha dor, de tamanho testemunho de amor e de fé, saiba que você espalha força e esperança a todos que sofrem com a perda de pessoas amadas! 🙏🏻🙏🏻🙏🏻♥️

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  5. Sem contar os momentos em que, do nada, vem uma dor que não nos deixa respirar. Aquele momento em que vc para e pensa: "vou perguntar se a mãe quer um café...", tal objeto "está no quarto da mãe..." e outros...
    Ou quando a gente se dá conta que não adianta guardar aquele pijama porque ela não vai voltar para usá-lo.
    Só faltaram cinco dias para a primeira dose da vacina.
    Seria mais fácil aceitar se fosse uma morte natural, e não pela irresponsabilidade de quem foi eleito para cuidar do povo brasileiro.

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    1. Sim, a “dor que não deixa respirar”… como é difícil

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  6. Quanta ternura e profundidade, na dor que nasce do amor, lindo!!!

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  7. Querida Denise, muito cedo (eu que vivia num mundo cor de rosa) eu pude vivenciar a perda da minha mãe. Já lhe disse isso, foi um divisor de águas na minha vida. Nunca mais fui a mesma. Algo se apagou.Mas Deus tem planos a nosso respeito. Por mais dolorosa que seja a perda, Deus a permite por algum motivo.

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  8. Muita emoção e muitas lágrimas ao fazer essa leitura, especialmente sobre a despedida de João Pedro. As despedidas, sempre muito difíceis e hoje são muito frequentes. Só Deus pra confortar os corações!!!

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  9. Denise , não existe nada no mundo mais difícil e doloroso que entregar um filho . Sim , são muitas despedias na despedida . Mesmo com muita fé nos desígnios de DEUS a dor é na alma. Sinto muito , mas muito mesmo pela sua dor. Lamento por todas as mãe que entregaram seus filhos . Bjs

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  10. Também lamento. Só quem passa por isso, sabe como é essa dor. 😥

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